sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Paulinho da Viola - Foi um rio que passou em minha vida (70)



"Apesar do nome artístico no diminutivo, Paulo César Batista de Faria, o Paulinho da Viola, é um artista grande, muito grande! Em 1970 este exímio cantor, compositor e instrumentista já tinha na bagagem nada menos que a autoria de um samba enredo campeão no Grupo especial do carnaval carioca ("Memórias de um sargento de milícias", de 1966) e um título no festival da Música Popular Brasileira da TV Record (por "Sinal fechado", de 1969). Mas a partir de Foi um rio que passou em minha vida, seu segundo (e irrepreensível) disco solo, é que sua carreira decolou de vez.

É nesse disco que a sonoridade de Paulinho em sua carreira solo começa a ganhar personalidade. E para alcançar tal resultado, foi necessário que as orquestrações, tão presentes no primeiro LP, fossem extremamente reduzidas. Aqui elas também ficam à cargo do famoso Maestro Gaya, mas aparecem de maneira mais contida e dosada, dando espaço àquela percussão maravilhosa, que Paulinho sempre soube usar muito bem. Consequentemente, temos um som menos Bossa e mais SAMBA! E que samba! Esse disco é simplesmente algo indispensável na discoteca de qualquer amante ou simpatizante do gênero. E se você é daqueles que não curtem o estilo por julgar que samba é esse "pagode farofa radiofônico" atual, garanto que se dessem uma chance a esse disco iriam se surpreender.

O álbum abre com "Para não contrariar você", sambinha em cuja letra Paulinho usa a Portela para fazer um "ciuminho" na mulher que gosta, seguida por "Meu pecado", samba de autoria de Zé Keti, um de seus padrinhos. Nessas duas primeiras músicas as orquestrações ainda são bem presentes. Mas a história muda em "Estou marcado", a terceira faixa do disco. Belíssimo samba, com letra boêmia ("Sem viola e madrugada eu não vivo sossegado" é um de seus versos) e nenhum instrumento em seu arranjo que remeta a algo que não seja o legítimo samba de raiz. A próxima é "Lamentação", de autoria do amigo Mauro Duarte, com letra que explicita a velha idéia popular do carnaval como bálsamo para as mazelas da vida, como na seguinte estrofe:

"Sem ideal, esperando o carnaval, pra matar minhas penas
Na esperança que um canto venha sufocar meu pranto
Mas carnaval são três dias apenas"

Dessa faixa, destaco ainda a linda levada dolente que, de súbito, aparece após o citado verso, dando uma forte quebrada no ritmo da música, para instantes depois recuperar sua levada inicial. Realmente um grande momento! A próxima é "Mesmo sem alegria", na minha opinião, simplesmente uma das melhores do disco. Tradicionalíssimo samba de terreiro, com uma levada gostosa, cantado por um coro no qual a voz de Paulinho se mistura a diversas vozes portelenses, para uma letra curta e direta sobre amor.

E o que dizer da música seguinte, a última do lado A (em homenagem aos amantes da boa e velha bolacha de vinil), a faixa-título? Um dos maiores (senão o maior) sucesso do artista, "Foi um rio que passou na minha vida", é uma declaração de amor à escola de samba que o revelou, a G.R.E.S. Portela, radicada no bairro de Madureira no Rio de Janeiro. Simplesmente um hino do samba! Na sequência temos "Tudo de transformou", canção bela porém triste, onde o artista canta um amor desiludido. Destaque para a bela orquestração, assim como para o coro do final da faixa. "Nada de novo" mantém a beleza e a tristeza, destacando mais uma vez o arranjo orquestral, aquí delicado e econômico. Mas a tristeza vai embora em "Papo furado", samba onde Paulinho descreve a figura do fofoqueiro, aquele sujeito desagradável, que não sabe guardar informações, tornando públicas coisa que não são da conta de ninguém, nem mesmo da sua. Paulinho, no entanto, o descreve maneira bem humorada, tornando a música ainda mais agradável.

Para o final, temos a belíssima "Não quero você assim". Lírica, com uma letra inspirada e um arranjo orquestral na medida certa, esse é outro grande momento do disco, que termina com um "gostinho de quero mais". E tanto isso é verdade que, quando a EMI relançou a obra de Paulinho remasterizada em Abbey Road (sim, o estúdio onde os Beatles registraram a sua obra) incluiu nesse disco como Bônus o compacto-duplo de quando o artista foi campeão do festival da Record,um ano antes desse disco. Nesse compacto temos a consagrada (e multi-regravada por outros artistas) "Sinal Fechado", que dispensa apresentações, e a engajada "Ruas que sonhei", samba no qual Paulinho, de maneira sutil, descreve as dificudades de um Brasil pós AI-5:

"Amor, repare o tempo
Enquanto eu faço um samba triste pra cantar
Te mostro a vida pra mudar o teu sorriso
Te dou meu samba com vontade de chorar"

Uma obra que, do começo ao fim, mostra a qualidade de um artista que, já na época, apontava caminhos para avançar sem, no entanto, perder as raízes e a tradição. E isso foi provado nos anos seguintes, principalmente na década de 1970, sua fase mais produtiva. No entanto, apesar de continuar viajando, fazendo shows, e lançando discos ao vivo, há mais de 10 anos Paulinho da Viola não lança um álbum inédito (o último foi o maravilhoso Beba do Samba, de 1996). E em tempos de "pagode farofa radiofônico", um novo álbum do mestre torna-se mais do que necessário! É indispensável! E é por isso que essa resenha chega ao fim com um apelo: Volta a gravar, Paulinho!!!"

(http://mastigandoamusica.blogspot.com.br/2007/07/paulinho-da-viola-foi-um-rio-que-passou.html)


Disco (com sinais de uso - sem riscos) e capa (sanduíche) em muito bom estado.
Edição Original de 1970 (MONO - selo Odeon).
Saindo por R$ 40,00

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