sábado, 14 de dezembro de 2013

Lou Reed - New York (89)



"Histórias de personagens afetados pela incerteza em um dos melhores discos solo do bardo...

No final dos anos 1980 diversos compositores norte-americanos estavam insatisfeitos com temas relacionados à AIDS, corrupção, segregação racial e ao vício desenfreado de crack.

Cidades metropolitanas como Nova York e Los Angeles eram os principais palcos das críticas vorazes de grupos emergentes como Public Enemy ou das críticas existenciais de John Cougar Mellencamp.

Foi na intenção de captar o clima fétido de Nova York que Lou Reed selou sua poesia urbana com o The Velvet Underground nos anos 1960, galgando os primeiros passos do punk rock.

Duas décadas depois a cidade pode ter evoluído bastante, mas o que o compositor percebeu é que havia uma diatribe generalizada.
As incertezas filosóficas permaneciam nas mentes borbulhantes de todos os habitantes da principal cidade dos Estados Unidos. Diversos paradigmas rondavam aquele cenário, e isso mudava a forma de como a pessoa interagia com o mundo.

New York não seria o primeiro nem o último disco de Lou Reed a perfilar aquela cidade. Canções como “Run Run Run” (The Velvet Underground & Nico, de 1967) e “New York Telephone Conversation” (Transformer, de 1972) descreviam a cidade como cenário de acontecimentos improváveis. Lá, arrastam-se drag queens e ouve-se fofocas o tempo inteiro.

No entanto, a tônica que Lou Reed dá a New York é mais descritiva e até literária (ele sugeriu que encarassem o disco como um livro mesmo). Em “Romeo Had Juliette”, um personagem ‘dá de ombros e xinga Jesus’; em “Dirty Blvd”, o garoto sonha em ficar mais velho e matar o pai que o maltrata.

Se Lou Reed é tido como um dos maiores poetas urbanos, New York é mais que sua prova cabal. Ele foi bem-sucedido em pincelar as composições com a crueza do rock. Para tanto, ele rompeu com as inovações estéticas sugeridas em Mistrial (1986) e muniu suas canções com guitarras e o melhor que o rock’n roll pode proporcionar.

Lou chamou o guitarrista Mike Rathke e a companheira Maureen Tucker, baterista dos tempos de Velvet Underground, e inseriu suas 14 faixas num entorno mais similar a The Velvet Underground (1969) e Loaded (1970).

Em New York, todavia, percebemos um Lou Reed mais loquaz: ele não tem medo de quebrar tempos musicais nas letras de “Romeo Had Juliette” ou “Last Great American Whale”. O que realmente importa é que o ouvinte acompanhe as histórias ali descritas e perceba como a distopia do final dos anos 1980 afetou aqueles personagens conturbados.

Claro que o lado observador apurado de Lou Reed contém notas próprias. Ele chega a assumir a primeira pessoa em “Beginning of a Great Adventure”, um blues entrecortado em que diz que ‘deve ser divertido ter uma criança para poder chutar por aí/Criar minha própria imagem como deus’. “Halloween Parade”, por outro lado, é Lou vendo o feriado de maneira enfadonha, como se estivesse apenas seguindo protocolo.

Em alguns momentos o bardo reúne o que há de melhor da descrição dylanesca para dar sobriedade às histórias que poderiam conter maior carga emotiva. “Xmas in February” é um bom exemplo: fala da trajetória de Sam, soldado que perdeu o braço no Vietnã e amenizou as dores se drogando com ópio. As melodias da guitarra seguem uma linha de lamento acústico e Lou Reed abaixa a voz. Há tristeza e, por mais imparcial que o cantor tente ser, percebemos que de alguma forma aquilo o comoveu. A decisão acertada aqui foi não apelar para os metais ou fazer uso de outros artifícios estéticos para despertar emoção. São tristezas, e tristezas acontecem a todo o tempo – como o cantor também enfatiza no country-rock de “Endless Cycle”: ‘A verdade é que eles são mais felizes quando estão em dor’, diz Lou ao descrever um casal em dificuldades.

Em contrapartida às faixas meditativas, Lou Reed faz de New York um disco essencialmente roqueiro. Os riffs de “Hold On” e “Busload of Faith”, por exemplo, empolgam bastante suas crônicas impetuosas.

“There Is No Time”, além de ter solos excepcionais, parece simular a velocidade dos metrôs de tão ágil. É a música da correria, a música em que Lou usa a falta de tempo tanto como fator intrínseco à cidade como fator de justificativa para as coisas que não foram feitas no passado. Uma frase daqui é bem valiosa: ‘Autoconhecimento é algo perigoso à liberdade de ser quem você é’.

“Strawman” é o tipo perfeito de rock de arena. Lou Reed aqui está agressivo, cansado das mesmas porcarias de sempre (‘alguém ainda precisa de uma estrela milionária?’). Ele induz o ouvinte a cantar junto em um dos melhores takes do disco.

E sabe aquela história antiga de que os Strokes não passam de imitações do Velvet Underground? Saiba que New York carrega a música que praticamente deve ter inventado a banda, “Good Evening Mr. Waldheim”, com aquela estética que se tornou chavão para a banda de Julian Casablancas: uma guitarra com riffs contínuos, uma segunda guitarra de solos circulares e bateria ininterrupta. Na música de Lou Reed, o formato é algo secundário perante à força de suas letras – principalmente em New York, um álbum que Lou Reed não precisava ter feito depois das muitas experimentações realizadas até então.

De fato, ele nunca se preocupou em se reerguer, porque seu teor criativo sempre prevaleceu ante preocupações financeiras. Sem precisar provar nada a ninguém e percebendo a atmosfera de incerteza que pairava naquela cidade que ele conhecia melhor que qualquer outra estrela do rock, Lou Reed entregou um de seus melhores discos solo. Você, inevitavelmente, terá outra visão da principal cidade norte-americana após a audição de New York."

(http://namiradogroove.com.br/grandes-albuns/lou-reed_new-york_1989)

Disco e capa em excelente estado; com encarte (letras).
Edição Original Brasileira de 1989.
Saindo por R$ 35,00


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